A aurora durante esse meado do
mês de setembro de 2012 tem sido abafada. O sol aparece no horizonte com uma
preguiça que não lhe é comum. Depois, ao longo do dia, castiga como que se não
tivesse piedade. Uma fumaça baixa prenunciando uma garoa que não vem acabada
por dar um tom entristecedor ao horizonte visualizado do 14º andar de um
edifício central na cidade de Goiânia, capital do Estado de Goiás. Dois
gaviõezinhos carijós, já em processo de extinção nos campos, pouco maior que um
bem-te-vi, em voos rasantes emitia um som diferente no seu canto. A princípio,
a ideia que se tinha era de que estavam em um balé de acasalamento. Os telhados
de amianto cobrindo os edifícios são locais escolhidos para a construção de
ninhos. Assim que o sol banhou o beiral de um dos telhados apareceu todo
imponente um enorme gavião Carcará. Só então o observador pode ter certeza de
que não se tratava de balé de acasalamento, tão pouco aquele canto tratava-se
de uma canção de amor. O casal de gaviõezinhos carijós em seus voos rasantes
tentava defender o seu ninho, e o canto era um grito de desespero. Na medida em
que o dia ia clareando mais rasantes eram os voos. O todo poderoso predador se
limitava a abaixar a cabeça quando aqueles kamikazes se atiravam contra o
inimigo. O observador desejou uma espingarda de pressão moderna para proteger o
casal em desespero. De onde estava era como se diz na roça ‘colocar o
chumbinho no carcará com a mão’. Mas a arma não existia. Na cidade não se pode
ter uma arma, nem mesmo para a defesa. Restava a ele observar. Torcer para que
o ninho não fosse atacado. Assim que o sol se apresentou por interno o
imponente personagem na canção de João do Vale deu alguns passos cheios de
preguiça e alçou voo. Os gaviõezinhos carijós desapareceram. De pouco adiantou
a torcida do observador. Naquele momento o Carcará fazia o ‘quimo’ de seu belo
breakfast daquela manhã.
Luiz Humberto Carrião
Setembro, 2012